Só vou falar disto uma vez
Nunca quis tocar no assunto, porque acho que o tema é delicado
demais, porque mexe demais comigo porque efectivamente já o “esventrei"
muitas e muitas vezes.
Este blog sempre me serviu de apoio às dificuldades, e hoje vai
servir mais uma vez para enterrar o tema em definitivo.
Sou obrigada a concordar comigo própria, que sim, que tenho
evitado escrever sobre o tema, em geral escrever, sobre tudo e sobre nada. Não
me queria expor, nem envolver demasiado anónimos, não há necessidade não há
porquê.
Mas a minha desilusão é imensa, foi, e é um dos momentos mais
difícil que atravessei na minha vida profissional, num momento que pôs em causa
a minha sanidade mental, a minha vivência familiar, o meu casamento, a minha
própria vida. Confesso que doeu muito, que doí muito, e custa a acreditar que
algum dia vou recuperar.
Mas revelar, acordar o mundo para a forma como as Mães são
tratadas nas empresas, como o seu trabalho é posto em causa, como se
"desfazem" das pessoas como se não fossem pessoas, é uma obrigação que
sinto no peito.
Sempre escondi os trâmites do processo, de todos os que não são
círculo restritíssimo da minha vida, mas sei que tudo se sabe, portas e
travessas existem em todo o lado, e levar uma empresa muito conhecida a
tribunal, pode ser tema tabu, pode ser tema que me desacredite hoje e no
futuro, perante todos, perante a família, os amigos, os novos patrões a
sociedade.
Levar uma empresa querida dos portugueses, da sociedade, com
patrões que ganham títulos de comendadores, netos que fazem reportagens
constantes na tv, empresa classificada como a que melhor trata os trabalhadores
em Portugal, leva-los a tribunal, lutar pelos meus direitos, tentar recuperar a
minha dignidade, faz inteiramente parte do meu ser e nunca, nunca seria capaz
de tomar outro caminho que não este,
Apesar de ter mantido o assunto, com reservas, na intimidade,
isso não significa que, ele não possa ter sido tema à boca pequena, de
todos os que trabalham naquela empresa, de todos os que trabalham com medo, de
todos os que se sentem mal diariamente com as atrocidades escondidas.
Nada apagará o sofrimento profundo em que estive a viver
nos últimos 8 meses, o passar dos dias demorados, o que fazia, se tomava
alguma coisa ou não, a paciência com os miúdos, a magreza, que perder 5 kg e
pesar 46Kg deixou-me no limiar do saudável, custou horrores, os tremores das
pernas, as batidas constantes de carro, das dificuldades em me olhar ao
espelho, o número de cacos em que estava a minha dignidade, as pulhices dos
advogados, custou-me tanto, tanto.
E depois veio o dia de ontem, e ainda olhei para o telemóvel com
esperança, de ver uma mensagem das pessoas que trabalharam comigo e que sabiam
que tinha sido despedida, porque tinha muitos filhos, sim, não fui despedida
por ser incompetente, ou me ter metido com o marido de ninguém da família, fui
despedida, por que tinha muito filhos, porque estive de licença de maternidade
e usei as regalias que o estado proporciona às mães.
Bastava-me que alguém daquela empresa, alguém daqueles que se
diziam meus amigos, me tivessem dito em segredo “força amiga”, claro que
teria preferido, um “f%&@ essa p#$a” mas qualquer uma me satisfazia, e
nada, nem uma mensagem, nem um toque, nada, ninguém, estava sozinha,
completamente sozinha. Foi tão pouco o que recebi! Foi nada! Tenho a
certeza que se fossem lugares opostos, eu não me calaria, não me deixaria
intimidar! E iria apoiar os meus amigos de trabalho. Sei que somos todos
diferentes, e amar os amigos, é também aceitar os seus defeitos, mas estes 8
meses, não foram defeitos que encontrei, foram falhas, e isso
magoou tanto, doeu tanto, e eu já tinha um fardo tão pesado em cima.
Serviu para descobrir que afinal aqueles não eram amigos, são
pessoas que passaram na minha vida, e que daqui a uns anos não me vou lembrar
de nomes, nem rostos.
Agora, já passou o processo, o assunto está arrumado, eu ganhei!!!
Ganhei na justiça, ganhei a razão, a ganhei a verdade, As empresas não podem tratar os trabalhadores como descartáveis, todos temos direitos, mas também temos deveres. As empresas não podem fazer o que lhe apetece, apenas porque apetece, e ficarem assim não apeteceu-me. As empresas, tem de ver os trabalhadores como pessoas, com seres humanos, que trocam trabalho por dinheiro, e não tem de ficar muito, muito agradecidos apenas porque sim. É ultrajante julgar um profissional pela quantidade de filhos que tem, é selvagem, é atroz. E os tempos de progresso, dizem que esse rótulo de que as mães são más profissionais tem se acabar.
Vem ai outra fase tão ou mais complicada, porque eu continuo sem
emprego e as contas para pagar são as mesmas, porque afinal os cacos são tão
difíceis de colar, porque o estigma da desempregada, não ficou no tribunal,
porque nem um único daqueles com quem falava todos os dias, que foram intimados
a comparecer na audiência, me olhou na cara, porque na vida não há borrachas
que apaguem a humilhação porque que passei, porque não há ninguém, nunca, nem
dinheiro nenhum no mundo que me restitua a magoa da rejeição.
Continuo sem dormir, só passou um dia, mas apesar de uma
sentença favorável, soube-me a pouco, muito pouco.
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